terça-feira, 9 de dezembro de 2008

SONETO "EU" DE FLORBELA ESPANCA


EU...

Florbela Espanca


Eu sou a que no mundo anda perdida,

Eu sou a que na vida não tem norte,

Sou a irmã do Sonho, e desta sorte

Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,

E que o destino amargo, triste e forte,

Impele brutalmente para a morte!

Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...

Sou a que chamam triste sem o ser...

Sou a que chora sem saber por quê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,

Alguém que veio ao mundo pra me ver,

E que nunca na vida me encontrou!

Um comentário:

Sérgio Deppe disse...

Sem dúvida, um dos sonetos mais lindos de Florbela Espanca. Retrata, talvez, seu coração deprimido por uma época repressiva em relação aos sentimentos femininos. Florbela nasceu em época errada mas era o propósito do Criador... talvez para renascer agora, nas belas performances de Stella Vives que "encarnou" a pessoa da precursora do feminismo em Portugal dando-lhe coninuidade de vida. Isto quer dizer que Florbela ainda está viva e, através dos lábios de Stella, que muitas vêzes se confunde com os dela, pode continuar sua grande obra. "Eu" retrata Florbela em sua essência, em sua fase depressiva aguda mas repleta de sabedoria e inteligência para transferir ao papel seu sentimento mais profundo.
Continue, Stella, a reviver Florbela mas não esqueça de tuas belíssimas poesias e sonetos que, inclusive, já foram confundidos com os de Florbela. Parabéns pelo teu trabalho !